Mortes associadas ao Exercício Físico

Sabia que as mortes associadas ao exercício físico ocorrem, quase na totalidade, em praticantes de meia-idade e nas atividades físicas de lazer?

Pouco se tem escrito sobre a ocorrência de paragem cardíaca súbita (PCS) durante as atividades físicas recreativas e de lazer. É vulgar associar-se o desporto de lazer à prática de exercícios de baixa intensidade e baixo nível de stress, o que nem sempre é verdade.

O exercício físico de baixa intensidade é considerado muito seguro e os seus efeitos benéficos são recomendados em todas as idades e em quase todas as situações.
O esforço intenso e o stress associado à competição, por outro lado, são gatilhos que podem originar a PCS e o enfarte do miocárdio.

Um estudo prospetivo, recentemente publicado* e que envolveu a população de Paris, de 2005 a 2018, demonstrou que 94,7% das 377 PCS associadas ao exercício físico ocorreram em praticantes de meia-idade e em desportos recreativos. Os autores salientaram, a propósito das medidas de prevenção deste evento, as duas estratégias fundamentais: triagem sistemática dos praticantes através do exame médico-desportivo e medidas de reanimação (RCR) imediatas no terreno, que devem incluir o uso muito precoce do desfibrilador automático externo (DAE).

A causa de morte mais frequentemente identificada foi a doença das artérias coronárias (68,7%), seguida das miocardiopatias (16,9%) e as cardiopatias elétricas (9,6%). A PCS foi presenciada em 347 casos (92,3%) e as manobras de reanimação foram iniciadas em 258 casos (68,4%). O DEA foi usado no terreno antes da chegada do serviço médico de emergência em apenas 38 casos (10,5%). Nestes casos, constatou-se também que poucos espectadores estavam cientes da mudança de regulamentação que possibilita, desde 2007, a utilização do DEA por leigos, e como tal destacaram a necessidade de educar o público para permitir o uso mais generalizado do desfibrilador.

A baixa eficácia do exame médico-desportivo na identificação dos indivíduos em maior risco de morte súbita tem sido apontada em vários estudos recentes, em particular quando se trata da doença coronária. Porque a doença aterosclerótica coronária é a principal causa de PCS nos praticantes de meia-idade, a melhoria do rastreio da aterosclerose arterial na população em geral e em particular nos atletas e praticantes com idade superior a 35 anos que desejam praticar atividades desportivas de lazer deverá ser objeto de profunda reflexão. O uso de técnicas de imagem (score de cálcio coronário, angiotac e angiografia coronária) para o diagnóstico estrutural da doença coronária e os testes funcionais de isquemia miocárdica (ressonância magnética e cintigrafia miocárdica com estudo da perfusão e a prova de esforço) para a estratificação do risco são atualmente os melhores recursos.

De salientar, por fim, que o exercício físico intenso e o stress foram os dois fatores-gatilho que mais frequentemente explicaram a ocorrência destes eventos em portadores assintomáticos de lesões não críticas, o que, juntamente com a elevada eficácia do tratamento médico na estabilização e mesmo na regressão da placa aterosclerótica, faz com que a utilização destes meios seja fundamental na prevenção a curto e a longo prazo.

A realização do exame de avaliação médico-desportiva é, nestes casos, fundamental. Nos atletas e desportistas mais velhos este exame incluirá exame clínico, cálculo do risco cardiovascular, eletrocardiograma de repouso e um teste de esforço máximo em tapete rolante, entre outros.

*Bibliografia: Marijon e col. Evolution oflncidence, Management, and Outcomes Over Time in Sports-Related Sudden Cardiac Arrest.J Am Coll Cardiol. 2022Jan 25;79(3):238-246.

Exames Médico-Desportivos

  • Teste de Tilt (síncope e disfunção autonómica)
  • Prova de Esforço em tapete rolante e cicloergometro
  • Holter (24/48 horas e 7 dias)
  • Registo de Eventos (relógio)
  • ECG de repouso
  • Registo de Potenciais Tardios
  • Ecocardiografias
  • Doppler Carotídeo

Artigo por: Prof. Ovídio Costa
Especialista em Cardiologia